"Reconheça-se que a designação Biblioteca a Arder de Espanto, para uma iniciativa, é em si mesma um espanto, um fascínio, deixando uma pessoa a arder de curiosidade para perceber o que poderá ser isso. Nada melhor então do que ir observar em directo: no Bartô do Chapitô, estão a realizar-se quinzenalmente, nas noites de terça-feira, iniciativas que decorrem sob aquela designação. Por causa do fogo que arde lá na lareira, aquecendo estas noites de Inverno? Por causa da imagem das chamas, reproduzida num ecrã vídeo? Morno, morno...Já ninguém, no Chapitô, sabe ao certo quem teve a ideia do nome, mas dizem-me, a várias vozes, que ela vem do filme de François Truffaut, Farenheit 451, adaptado do romance homónimo de Ray Bradbury, cuja intriga se centra na proibição e queima de livros, referindo-se o título à temperatura a que arde o papel. E como se chega daí a uma iniciativa de animação cultural, circum-escolar, ligada ao plano de cursos da escola e, por outro lado, aberta ao público?Na topografia do local, o bar funciona, à noite, exactamente no mesmo espaço, polivalente, que é sala de aulas de dia, sendo, ao mesmo tempo, local de passagem para a Biblioteca Luiza Neto Jorge - a poetisa doou grande quantidade de livros à instituição, "porque éramos amigas e ela se afligia com a minha ignorância, achava que eu precisava de ler muito", adianta-nos Teresa Ricou (ou será Teté?), com certo ar de gozo.O ardor da biblioteca, passado por diferentes sentidos figurados, pode fixar-se no da paixão pelos livros e pela leitura, sendo esta que preenche tais sessões. Estas decorrem com os seus rituais.Anunciada como "uma aventura com livros que serve de pretexto à descoberta, ao despertar da curiosidade e do interesse pelo literário", constitui uma plataforma de ligação entre as várias facetas de actividade do Chapitô, tendo como pano de fundo a obra do escritor russo Mikhail Bulgakov, Margarida e o Mestre, a ser trabalhada sob orientação do actor e encenador Nuno M. Cardoso, no segundo ano.E é Nuno M. Cardoso que funciona como animador-bibliotecário, que tenta incendiar assistentes e participantes. O programa de leitura varia quinzenalmente. Na terça-feira, 13, quando lá fomos, a leitura incidia na poesia modernista, incluindo os portugueses da geração de Orpheu - Almada Negreiros, Pessoa e heterónimos, etc. À volta duma mesa gigantesca (as mesas do Bartô reunidas), coberta por um veludo pesado grená, não cabiam numa só fila todos os presentes. Outros docentes e colaboradores da instituição, incendiados pela leitura, foram, com grande destaque, a professora de História de Artes, Noémia Cardoso; o sociólogo Orlando Garcia; a professora de Português Helena Azevedo, last but not the least, a mais ardente nas leituras.Ainda que o objectivo principal, de iniciativas como esta, segundo Teresa Ricou, seja "envolver o corpo docente, preparar a acção pedagógica e um espectáculo no final do ano", as portas estão abertas a quem quiser entrar. A próxima Biblioteca a Arder de Espanto está marcada para terça-feira, 27, às 21.30.Quem estiver menos interessado em ouvir exclusivamente - com todo o ardor -, pode sempre ir olhando para o ecrã na parede ao fundo do Bartô, pelo qual continuam a desfilar imagens, todavia sem interferência sonora na acção principal."
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